24-02-2025
Em uma surpreendente declaração, o presidente turco Recep Tayyip Erdogan afirmou que a Ucrânia não apenas merece ingressar na OTAN, como também deve recuperar todos os territórios ocupados pela Rússia, incluindo a Crimeia. Esta posição representa um importante movimento geopolítico que pode alterar significativamente o equilíbrio de poder na região.
Confira nossa análise em vídeo:
Por que a posição da Turquia é relevante?
A Turquia ocupa uma posição estratégica crucial no conflito entre Rússia e Ucrânia por várias razões:
- É o segundo maior exército da OTAN, ficando atrás apenas dos Estados Unidos
- Controla os estreitos que conectam o Mar Negro ao Mar Mediterrâneo, essenciais para o comércio marítimo e movimentação militar russa
- Possui uma longa história de rivalidade e conflitos com a Rússia
Relações históricas entre Turquia e Rússia
As relações entre turcos e russos são marcadas por séculos de conflitos. Houve uma breve aproximação durante o governo de Lenin na Rússia, que chegou a apoiar rebeldes turcos em sua luta pela independência. No entanto, essa cooperação durou pouco. Quando Stalin assumiu o poder, passou a reivindicar territórios turcos, levando a Turquia a se alinhar com o Ocidente e ingressar na OTAN.
A questão da Crimeia
A Crimeia representa um ponto particularmente sensível nessa relação. A península, anexada pela Rússia em 2014, tem fortes laços históricos com a Turquia e abriga uma significativa população de turcos étnicos. Erdogan já declarou publicamente que "a dor dos tártaros da Crimeia", descendentes dos turcos que foram forçados a deixar a região, "ainda não diminuiu mesmo depois de 80 anos".
Enquanto a Turquia intensifica seu apoio à Ucrânia, os Estados Unidos parecem adotar uma abordagem diferente. O Secretário de Defesa americano Pete Hexist teria declarado que os EUA estão dispostos a abrir mão da entrada da Ucrânia na OTAN e que o país não deveria esperar recuperar suas fronteiras de 2014 – praticamente cedendo às exigências russas antes mesmo do início de negociações.
Aproximação da Turquia com a União Europeia
Em paralelo a essas tensões, a Turquia está se aproximando da União Europeia, o que poderia transformar completamente o cenário geopolítico regional. Como potencial membro da UE, a Turquia seria obrigada a:
- Aderir às sanções contra a Rússia
- Reduzir significativamente suas importações de petróleo russo (atualmente é o terceiro maior importador mundial)
- Implementar inspeções mais rigorosas nos navios que atravessam seus estreitos
- Suspender cooperações militares com a Rússia
O caso do sistema de defesa S-400
Em 2017, a Turquia adquiriu da Rússia o sistema de defesa antiaérea S-400, um dos mais avançados do mundo. Esta compra gerou uma crise nas relações com os EUA, que expulsaram a Turquia do programa do caça F-35 e impuseram sanções econômicas.
É importante entender que esta não foi a primeira opção dos turcos. Originalmente, eles buscaram adquirir o sistema americano Patriot, mas os EUA recusaram a venda e ainda retiraram os sistemas que já estavam instalados no sul da Turquia. Com opções limitadas e necessidades reais de defesa, a Turquia fechou acordo com a Rússia.
O problema para a OTAN é que o S-400 funciona melhor quando integrado à infraestrutura militar do país, criando riscos de vazamento de informações sensíveis. Após cinco anos de tensões, os EUA propuseram um acordo: a Turquia poderia manter os sistemas, mas armazenados na base aérea de Incirlik sob supervisão americana, em troca da readmissão no programa F-35 e suspensão das sanções.
Um momento de redefinição
O cenário geopolítico mudou significativamente desde 2019, quando a Turquia adquiriu o S-400. Na época, o país tentava equilibrar suas relações com o Ocidente e a Rússia. Hoje, com a guerra na Ucrânia, a Turquia adotou uma postura muito mais firme contra Putin.
Com o segundo maior exército da OTAN, controle sobre pontos estratégicos vitais e crescente aproximação com a União Europeia, as decisões da Turquia nos próximos meses podem ter consequências profundas não apenas para o conflito na Ucrânia, mas para todo o equilíbrio de poder regional.
Se a Turquia realmente estreitar laços com a UE e o Ocidente, a Rússia poderá perder um dos poucos países importantes que ainda mantêm relações relativamente próximas com Moscou, além do acesso facilitado aos estreitos que são vitais para sua economia e poderio militar.
O que observamos é um momento histórico de redefinição das alianças globais, onde a Turquia parece estar finalmente escolhendo um lado depois de anos comprando petróleo e sistemas de defesa russos enquanto fornecia drones para a Ucrânia.
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